The Film Handbook#101: Peter Greenaway

Main image of Early Greenaway

Peter Greenaway
Nascimento: 05/04/1942, Londres, Inglaterra
Carreira (como diretor): 1973-

O excêntrico Peter Greenaway começou sua carreira realizando curtas experimentais de baixo orçamento revelando uma obsessão erudita por taxonomia, numerologia, história natural e anedotário apócrifo. É portanto, então, surpreendente que sua transição para os longas, realizada com pouca evidência de compromisso artístico, tenha sido tão bem sucedida.

Os primeiros filmes de Greenaway foram ao mesmo tempo sátiras formalmente ambiciosas e engenhosas dos estilos cinematográficos documentais. Windows é sobre 37 pessoas que morreram caindo de janelas. Water Wrackets mescla planos líricos de córregos com uma narração seca sobre uma dinastia esquecida e desumana. A Walk Through H apresenta panorâmicas sobre mapas bizarros para explicar a obra do ornitólogo ficcional Tulsa Luper. E em Vertical Features Remake>1, várias reconstruções hipotéticas de um filme de fragmentos apresentando objetos verticais em uma paisagem servem para parodiar, de forma hilária, o pedantismo acadêmico, enquanto o épico The Falls oferece breves biografias de 92 vítimas (cujos nomes começam com FALL) de um Evento Violento Desconhecido envolvendo pássaros.

O Contrato do Amor/The Draughtsman's Contract>2 apresentou o talento único e zombeteiro de Greenaway para um público maior. Um mistério labiríntico do século XVII (sobre um pintor que, pago com favores sexuais para ornar uma casa de campo, acredita que suas pinturas tenham descoberto um assassinato), é um retrato em trocadilho de mecenato e luta de classes entre um artista e a nobreza. Ainda mais típico do diretor-roteirista foi Zôo - Um Z e Dois Zéros/A Zed & Two Noughts>3 no qual dois gêmeos, que tiveram suas esposas mortas em um acidente de carro, buscam consolo estudando o declínio biológico, fazendo amor com a única vítima do acidente, amputada e se entregando ao desejo de se tornarem gêmeos siameses. Destituído de trama e embalado com anedotas improváveis, o filme, com seus personagens oriundos dos deuses romanos, é uma surreal comédia de humor negro sobre dor, perda e evolução, observando o mundo como um perverso zoológico humano; de forma crucial, a interconexão entre muitas de suas ideias se deu através da ordenada simetria do trabalho de câmera inspirado em Vermeer de Sacha Vierny e pela música barroca de Michael Nyman. De fato, o interesse de Greenaway em arte audiovisual foi confirmada por obras para a televisão como a série Four American Composers e a versão curta do Inferno de Dante, realizadas em colaboração com o pintor Tom Phillips.

A originalidade intelectual de Greenaway é inegável, mas muitos acreditam que sua obra sofre com a ausência de profundidade emocional. Em A Barriga do Arquiteto/The Belly of an Architet, uma interpretação infeliz de Brian Dennehy como um arquiteto americano em estado terminal de câncer quase destrói o filme por completo. Mesmo assim, quando a vida do arquiteto fica de lado, sua mulher o abandonando por um italiano que planeja se apoderar da exibição que ele havia planejado em homenagem ao esquecido visionário Boullée, o filme apresenta a permanente recusa de Greenaway de apenas contar uma história: história romana e arquitetura, a inocência do Novo Mundo e a decadência do Velho,e intermináveis rimas verbais e visuais e alusões são intercaladas em uma configuração complexa tão intrigante quanto palavras cruzadas sem solução. Da mesma forma, Afogando em Números/Drowning by Numbers>4 observa um ingênuo médico legista explorado e destruído por uma amiga, sua filha e neta, todos com o mesmo nome, todos culpados de terem assassinado seus maridos. Novamente, diálogos repletos de sentidos e imaginário surrealista evocam singulares e implícitas ligações entre jogos primitivos e números, humanidade e natureza; mais uma vez, uma lorota é investida de hipóteses filosóficas, falsas estatísticas e metáforas mágicas.

Se as excursões auto-conscientes de Greenaway em mitos privados soam emocionalmente frias e tão distantes da realidade cotidiana que beiram a auto-paródia, ele permanece um diretor imaginativo e provocativo. Suas obsessões com jogos de palavras, listas e arquivos secretos podem aparentar serem literárias, mas seu olhar para padrões visuais e a beleza cruel da natureza asseguram seu status como um artista cinematográfico único.

Cronologia
Embora Greenaway pareça não possuir antecessores no cinema, a literatura fornece um paralelo nos escritos de Borges, e a importância de contribuições regulares de Vierny e Nyman não podem ser subestimadas. É interessante, no entanto, compará-lo em suas tendências surreais/míticas com as de Buñuel, Demy, Fellini, Gilliam, Lynch, Resnais, Syberberg, Michel Deville e Raoul Ruiz.

Destaques
1. Vertical Features Remakes, Reino Unido, 1979

2. O Contrato do Amor, Reino Unido, 1982 c/Anthony Higgins, Janet Suzman, Anne Louise Lambert

3. Zôo - Um Z e Dois Zéros, Reino Unido/Holanda, 1985, c/Brian & Eric Deacon, Andrea Ferreol, Joss Ackland

4. Afogando em Números, Reino Unido, 1988 c/Bernard Hill, Joan Plowright, Juliet Stevenson

Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 120-1

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