Filme do Dia: Las Doce Sillas (1962), Tomás Gutiérrez Aléa


Las doce sillas Poster


Las Doce Sillas (Cuba, 1962). Direção: Tomás Gutierrez Aléa. Rot. Adaptado: Ugo Ulive & Tomás Gutierrez Aléa, a partir de um conto de Ilya Ilf & Eugene Petrov. Fotografia: Ramón F. Suarez.  Música: Juan Blanco. Montagem: Mario Gonzalez. Figurinos: Carmelina García. Com: René Sanchez, Idalberto Delgado, Piliy Vallejo, Ana Ninãs, Silvia Planas, Manuel Pereiro, Pedro Martín Planas, Ricardo Suarez.
Com a morte de uma velha senhora da decadente aristocracia cubana, dá-se uma perseguição frenética as cadeiras inglesas, já que numa delas a senhora havia escondido as jóias em seu interior.
Talvez o que torne essa pioneira produção da Cuba pós-revolucionária mais interessante seja a utilização de convenções de gênero para tentar mascarar seu tom fortemente ideologizado e, ainda mais que isso provavelmente, sob uma visada retrospectiva no que diz respeito a filmografia do próprio realizador, o quanto os clichês associados aos novos preceitos “revolucionários” na sociedade cubana acabam soando tão esquemáticos e passíveis de ironia quanto os que são abertamente debochados pelo filme em relação ao recente passado/presente que antecede à Revolução. Fazendo uso de um prólogo em animação bem antenado com a verve internacional então em moda de uma apresentação estilosa (ainda que aqui antecedendo os créditos, mas do que propriamente nestes) e de cacoetes cômicos que evocam um humor algo devedor talvez do cinema britânico, como as comédias de Alexander MacKendrick. Ao longo da narrativa são incluídas cartelas e um tema a pianola que são referências à comédia muda, e a busca pelas cadeiras serve como pretexto para que Aléa consiga explorar o que melhor sabe fazer, que é uma crônica de costumes da sociedade cubana, aqui reduzida a tipos mais do que situações plenamente desenvolvidas. E, em escala mais ampla, para que a própria trama sirva como referência direta à ganância capitalista, associada aos dois escroques que são os personagens principais, assim como em menor medida à hipocrisia religiosa, representada pela subtrama pouco desenvolvida e orgânica com o restante da narrativa, do padre em busca das mesmas cobiçadas cadeiras. No seu final, ao contrário da “busca pelo tesouro” resultar como metáfora para a própria vacuidade e mesquinhez dos desejos humanos tais como postos em filmes como Ouro e Maldição (1923), de Stronheim ou O Tesouro de Sierra Madre (1948), de Huston, a essas características são agregados o elemento moralizador que serve como espelho da própria pretensão da revolução, ou seja, o tesouro havia se transformado em um bem coletivo e social, administrado como o fora responsavelmente pelo governo revolucionário. E a dimensão de classe surge como algo delimitadora do caráter de seus personagens. Assim, na dupla de escroques, o empregado que agira de forma quase tão cínica quanto o patrão, mas que já demonstrara uma maior empatia com a causa revolucionária, ao se integrar mais rapidamente aos cortadores de cana a quem pedem carona, diverge de vez desse ao final, acenando positivamente para um novo sentido de vida, despido da irracionalidade gananciosa daquele, que se afasta pela estrada sozinho. Faz grande uso de efeitos de estilo disseminados pela Nouvelle Vague, como inserções documentais, experimentações com a banda sonora – sobretudo na reprodução da voz da senhora em vias de falecer, de efeito gráfico já que diretamente associado a animação recém-vista, foto fixa e aceleração do movimento, ainda que sua estrutura narrativa ainda permaneça bem mais fincada na tradição da comédia, ao contrário de uma produção posterior mais associada com o que veio a ser defendido como “cinema imperfeito”. ICAIC. 94 minutos.

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