Filme do Dia: Anjos Caídos (1995), Wong Kar-wai


Anjos Caídos (Duo Luo Tian Shi, Hong Kong, 1995). Direção e Rot. Original: Wong Kar-wai. Fotografia: Christopher Doyle. Música: Frankie Chan & Roel A. García. Montagem: William Chang & Ming Lam Wong. Dir. de arte e Figurinos: William Chang. Com: Leon Lai, Michelle Reis, Takeshi Kaneshiro, Charlie Yeung, Karen Mok, Chan Fai-hung, Chan Man-Lei, Toru Saito.

Um desiludido asssassino por encomenda (Lai) se sente atraído pela primeira vez em muitos anos de profissão por sua sócia (Reis), enquanto um jovem mudo (Kaneshiro) se atormenta por não ser amado pela moça (Yeung) que ama e realiza vídeos domésticos com o pai que logo depois falecerá de câncer.

Pouco importa o enredo, na verdade, já que o verdadeiro sentido e expressividade do filme de Kar-wai é transmitido por um estilo visual e narrativo bastante idiossincrático. Compõem esse universo imagético uma féerica e surreal Hong Kong, a constante presença de lentes grandes angulares e sequências que praticamente se sustentam mais por si só que propriamente como fragmentos de um encadeamento narrativo mais coeso, dificultando qualquer tipo de leitura realista mais convencional. Assim como sutis intervenções na velocidade das imagens. Como Godard, Kar-wai não pretende que seus personagens seja nada mais que personagens e a complexidade de uma narrativa de múltiplas vozes dificulta ainda mais o espectador se situar, pois existem momentos em que o narrador do momento se refere não somente a si próprio quanto aos outros personagens do sub-enredo. E, em um golpe de mestre, Kar-wai faz com que seu personagem mudo se comunique com o espectador através da voz off. Também provoca um grande efeito de estranhamento a sua utilização de temas musicais inusitados para as situações descritas. De fato, todos esses elementos que seriam retrabalhados na obra posterior de Kar-wai já se encontram aqui presentes, talvez aqui de modo mais impositivo e por vezes até mesmo canhestro, com um sentido de experimentalismo que flerta com o anti e o meta-narrativo (evocativos de um filme como O Bandido da Luz Vermelha) que posteriormente seria domesticado em narrativas mais convencionais. Porém, não há como negar o tino para conjugar imagem e som de uma maneira peculiar, mesmo beirando por vezes certas estratégias de expressão do desencanto e tédio dos personagens já trabalhadas por realizadores como Fassbinder e Jarmusch. O gestual do elenco como um todo, no entanto, parece mais ser um suporte a mais para o incansável grafismo do realizador, que beira por vezes o do universo das histórias em quadrinhos, assim como uma multiplicidade de outras referências (cinema noir, western, publicidade, filmes de gângster, kitsch), algo que Godard já havia efetivado pioneiramente na década de 60. Chan Ye-Cheng/Jet Tone Prod. Co. 90 minutos.


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